PETER LIPTON: Há dias, estava eu a almoçar quando um diabinho poderoso me deu a escolher entre duas hipóteses: uma, os meus filhos singrarão numa vida próspera, mas eu viverei convencido de que eles vivem uma vida miserável (o que faria com que eu me sentisse miseravelmente); a outra, os meus filhos viverão de facto uma vida de miséria, mas eu viverei convencido de que eles singram numa vida próspera (o que faria com que eu me sentisse muitíssimo feliz). Assim que eu anunciar a minha escolha, a minha memória de ter feito esta escolha esfumar-se-á, aliás, esfumar-se-á inclusive a minha memória de ter almoçado com o diabinho. Sabe que mais? Vou escolher a hipótese “filhos felizes, eu miserável”. Não sou nenhum anjo, mas este é um acto altruísta.
JYL GENTZLER: O facto de, em geral, sentirmos prazer quando temos noção de que fizemos algo que acreditamos ser bom não implica que tenhamos praticado essa boa acção pelo prazer que esperamos que advenha de a realizarmos. É verdade que fazemos muitas coisas cuja motivação para que as façamos se prende apenas com o prazer que elas nos proporcionam. Muitas pessoas têm relações sexuais apenas porque ter relações sexuais lhes dá prazer, tal que, se não lhes desse prazer, não o fariam, e talvez não o pudessem fazer. Mas nem todas as nossas acções se enquadram nesta categoria. Há coisas que fazemos simplesmente porque estamos convencidos de que valem a pena ser feitas. E dado que acreditamos que valem a pena ser feitas, sentimos satisfação quando sabemos que fizemos uma coisa que valia a pena fazer. Todavia, não pode ser o caso que façamos este tipo de acções pelo prazer que o facto de as fazermos nos transmite, uma vez que o próprio facto de sentirmos este prazer depende de atribuirmos valor independente às acções levadas a cabo ou às consequências dessas acções. Por exemplo, se eu não considerasse que era uma boa ideia contribuir para a Oxfam [Organização não governamental internacional de combate à fome e à pobreza] com parte dos meus limitados recursos, não sentiria prazer em fazê-lo. Assim, o facto de acreditar que é uma boa ideia que eu contribua para a Oxfam não pode ser motivado apenas pela minha expectativa de que virei a retirar algum prazer pelo facto de o ter feito.
THOMAS POGGE: Dada a imensa diversidade da conduta humana ao longo das épocas e nas mais variadas culturas, é fácil descobrir contra-exemplos plausíveis. Porém, tais contra-exemplos estão sempre sujeitos a ser liminarmente contestado por observações como a que menciona: a acção aparenta ser altruísta, mas é efectivamente motivada pela satisfação que o agente espera derivar da expiação de uma culpa ou da aprovação por parte de terceiros. Mesmo quando uma pessoa se atira para cima de uma granada prestes a explodir para salvar os seus camaradas, poderá sempre haver quem diga que a satisfação que este indivíduo espera vir a obter, por exemplo sob a forma de louvor por parte dos seus camaradas, terá certamente pesado mais na ponderação dele do que o receio que lhe inspira a dor, e a morte, que sabe que vai sofrer ao tomar esta atitude.
O problema com este tipo de objecção é o facto de conduzir a uma circularidade. O facto de uma pessoa agir de certa maneira é tomado como suficiente para mostrar que terá forçosamente que ter havido uma motivação egoísta para essa acção. E a proposição em questão (i.e., todas as acções humanas são motivadas por interesse próprio) passa assim a ser completamente imune a refutação. Passa a ser repetida a propósito de toda e qualquer acção. E, uma vez assim sendo, deixa de ser expressão de uma descoberta (perturbadora) sobre o mundo específico em que vivemos. [...]
Consideram estas respostas esclarecedoras? E concordam com elas?