Tantas vezes ouvi este desabafo:
«Qual o interesse de ensinar lógica aos adolescentes aprendizes de filosofia? É errado submeter a filosofia à frieza linear e mecânica da lógica! A lógica é, de resto, bastante limitada e nem tudo se pode reduzir à lógica.»
A pergunta é perfeitamente justificada e o tema merece ser debatido. No entanto, o resto do desabafo assenta em dois pressupostos duvidosos. Mas um deles não é o de que a lógica é limitada. Isso é uma verdade; uma trivialidade, diria mesmo.
Claro que a lógica é limitada! E ainda mais se pensarmos na pequeníssima parte da lógica que se ensina no secundário. Basta ver que as ferramentas de lógica proposicional dadas no secundário não são muito mais complexas nem mais extensas do que a aritmética básica que os alunos aprendem na escola primária. A lógica que se ensina no secundário é mais ou menos comparável às operações algébricas elementares aprendidas na escola primária: adição, subtracção, multiplicação, divisão e igualdade. Quanta matemática não fica de fora também aí?
Ainda assim, qualquer um reconhece que, apesar de limitada, essa matemática básica não deixa de ser imprescindível para resolver muitos dos seus problemas práticos quotidianos: por exemplo, para descobrir quantos lápis pode comprar com o dinheiro que a mãe lhe deu ou para confirmar se o troco que lhe dão está certo. Claro que ainda não dá para resolver complexas equações de terceiro grau nem para calcular a raíz quadrada de um número.
Porquê, então, afirmar a banalidade de que a lógica é muito limitada? Será que alguém pensa que a lógica que se ensina é toda a lógica? Há muitíssima mais lógica para estudar do que isso. E só quem procura aprofundar o seu estudo está em condições de reconhecer quais são exactamente as suas reais limitações, que não são poucas. Daí que, ao contrário do que muitas vezes se pensa, também na lógica haja intenso debate e divergências fundamentais. E muitas discussões não são apenas sobre os aspectos mais recônditos e rebuscados da lógica. Coisas como os princípios da não-contradição e o do terceiro excluído ou a semântica de algumas condicionais têm sido amplamente debatidas, dando mesmo origem a sistemas lógicos alternativos à lógica clássica, rejeitando vários aspectos desta.
Para se ter uma ideia, veja-se o esquema acima. Comecei a elaborar esse esquema há uns anos, depois da leitura de Deviant Logic, de Susan Haack, um livro de 1974. Fui lendo outros livros sobre lógica e, tendo em mente uma acção de formação de lógica para colegas entretanto agendada, acabei por concluir a tarefa.
É importante sublinhar que mesmo este esquema não inclui toda a lógica, o que permite ter uma ideia do vasto universo que constitui a modelação do raciocínio comum.
Aceitam-se eventuais correcções ao esquema. Dado que foi feito por mim, é possível que alguém encontre imprecisões. Devo dizer que não sou um especialista (nem grande nem pequeno!) em lógica, mas tenho o prazer de conhecer várias pessoas muitíssimo mais entendidas no assunto do que eu, com as quais também tenho aproveitado para aprender.
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