Poderíamos continuar a acumular evidências como as apresentadas para validar a ideia da Revolução Científica, mas muitos estudiosos continuariam a não se sentir convencidos, nem capazes de serem convencidos. A ansiedade que agora perturba os historiadores, quando lêem as palavras «científica», «revolução», «moderno» e (a pior de todas) «progresso» em estudos de ciência natural do século XVII, revela não só o medo da linguagem anacrónica. É também um sintoma de uma crise intelectual muito maior, que se expressou num recuo generalizado perante todas as grandes narrativas. O problema das grandes narrativas, diz-se, é que elas privilegiam uma perspetiva sobre outra; e a alternativa é um relativismo que mantém que todas as perspetivas são igualmente válidas.
Os argumentos mais influentes a favor do relativismo provêm da filosofia de Ludwig Wittgenstein (...). Foi só no final dos anos cinquenta, a seguir à publicação de Investigações Filosóficas, em 1953, que os argumentos inspirados em Wittgenstein começaram a transformar a história e a filosofia da ciência. A sua influência já pode ver-se, por exemplo, em A Estrutura das Revoluções Científicas. A partir daí passou a ser vulgar afirmar-se que Wittgenstein demonstrara que a racionalidade era, no seu todo, culturalmente relativa: a nossa ciência pode ser diferente da dos antigos romanos mas não temos fundamento para afirmar que era melhor, porque o mundo deles era absolutamente diferente do nosso. Não há um padrão que permita comparar os dois. A verdade, segundo a doutrina de Wittgenstein de que o significado é o uso, é a que nós escolhemos; ela exige um consenso social mas não a correspondência entre aquilo que dizemos e o mundo como ele é.
A primeira vaga de relativismo foi mais tarde complementada por outras tradições intelectuais profundamente diferentes: a filosofia linguística de J. L. Austin, o pós-estruturalismo de Michel Foucault, o pós-modernismo de Jacques Derrida e o pragmatismo de Richard Rorty. A expressão «a viragem linguística» é muitas vezes usada para indicar todas essas diferentes tradições, porque elas partilham um sentido comum, como o explicitou Wittgenstein, em que «os limites da minha linguagem são os limites do meu mundo». Como veremos, grande parte dos debates sobre a Revolução Científica provêm das ramificações desta perspetiva.
David Wootton, A Invenção da Ciência. Temas e Debates, 2017, pp. 60-61.
Sem comentários:
Enviar um comentário