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segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Falácias

Como estamos perto do dia do teste e as dúvidas ainda andam pelo ar, gostávamos de propor aos colegas do 11º ano um exercício de identificação de falácias.

Tomem em consideração que as seguintes falácias tanto podem ser formais como informais.


A)  Se está a nevar, os aviões não levantam voo.
Os aviões não levantam voo.
Logo, está a nevar.



       B)  Sr. Dr. Juíz peço-lhe por favor que não me     
             prenda, porque se o fizer os meus filhos         
             ficam desamparados.

       C)  Ainda ninguém provou que Deus existe.
     Logo, Deus não existe.

D)  Ou te portas bem e tiras boas notas ou então bem podes esquecer as férias de verão.

E)  O José Machuca é inteligente ou anormal. Como não se revelou inteligente, logo é anormal.

F)  Comeu laranja à noite, antes de se ir deitar, e sentiu-se mal.
     Logo, a laranja faz mal ao organismo quando ingerida à noite.

G)  Continuas tão egoísta como eras?

H)  Se amanha me sair o euromilhões, compro esta vivenda.
      Amanhã não me sai o euromilhões.
      Logo, não compro esta vivenda.

I)  Toda a gente sabe que os políticos são corruptos. Por isso, não faz sentido provar o contrário.

J)  É pegar ou largar!

K) Einstein, o maior génio de todos os tempos, gostava de maçãs.
Logo, as maçãs são o melhor alimento do mundo.

L) Querem mais escolas abertas? Querem melhores condições no nosso pais? Querem mais emprego, então não votem nesse político.

M) O que é a História? É a ciência que estuda factos históricos.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Será legítimo fazer a guerra para alcançar a paz?

Miguel Granja, professor da ESMTG

Alguns alunos das minhas turmas do 11º ano manifestaram interesse em discutir um dos textos escritos por outro colega, professor de Filosofia, em resposta a uma questão filosófica que lhe foi colocada, no âmbito da comemoração do dia mundial da filosofia. A questão está formulada no título desta posta e a resposta do professor Miguel Granja está abaixo. Concordam? Porquê?


Hobbes Como Condição de Possibilidade de Kant. 

Entre a desonra e a guerra, escolhestes a
desonra e tereis a guerra
                            Winston CHURCHILL

      A dolorosa história da Segunda Guerra Mundial e, em particular, a nossa experiência com o nazismo deviam ter acabado já, de uma vez por todas, com a argumentação pacifista segundo a qual não há «guerras justas». Infelizmente o debate permanece vivo, cobrindo-nos de ridículo e de falência moral. Talvez devêssemos colocar a pergunta do avesso, alterando-a apenas ligeiramente: Será legítima uma paz falsa e injusta para evitar a guerra? A intemporal frase de Churchill que uso em epígrafe é, em si, todo um tratado de filosofia política e foi dirigida, como sabemos, ao pacifista Chamberlain acabadinho de alcançar o pacifista Acordo de Munique, em 1938, com Hitler. Como nos ensinou (e temo que tenha já deixado de nos ensinar) esse vergonhoso episódio pacifista, a paz desejada, infelizmente, não se realiza só porque a desejamos. A paz, tal como a guerra, faz-se. E é um erro pensar que a paz se alcança só porque não se faz a guerra, como se a paz fosse uma consequência natural e lógica do fim da guerra. Não raro, a paz a todo o custo tem um custo demasiado elevado. Custou parte da Checoslováquia, desde logo, aos checoslovacos em nome da nobre vontade de paz dos franceses e dos britânicos: e a vontade de paz de uns é a anexação e opressão dos outros. Portanto, quando a França e a Grã-Bretanha querem a paz com Hitler, quem sofre com isso são os checoslovacos. Em 1939, Hitler, desrespeitando o tratado, invade o resto da Checoslováquia.
     Isto devia ensinar-nos que estamos acostumados a pensar que o contrário da guerra é a paz e que essa é, porém, uma ideia errada. O contrário da guerra é, muitas vezes, a injustiça, a repressão, o genocídio, a cumplicidade, e só a guerra, e não a «paz», pode pôr-lhes cobro. O recurso à guerra teria sido desejável para acabar com o genocídio no Ruanda em 1994 e foi esse recurso à guerra, por parte da NATO, em 1999, que acabou com o genocídio em curso por parte de Milošević. Mas, para isso, foi preciso o hobbesiano Clinton fazer o trabalho sujo que a kantiana Europa não foi capaz de fazer, mesmo às suas portas. Em nome da paz, claro. Porque a guerra é sempre estúpida e injusta. 
     Convém talvez não esquecermos que a primeira «manifestação global»  do século XXI, com milhões de pessoas nas ruas de todo o mundo, não foi em 2001, por causa do 11 de Setembro: foi em 2003. Por causa da iminente guerra dos EUA no Iraque. Portanto, porque é preferível manter o povo iraquiano brutalmente oprimido por Saddam Hussein do que fazer a guerra. Como se aqui, mais uma vez, o contrário da guerra fosse a paz. Em 2003, regressámos, em rebanhada global, ao nosso Momento Checoslovaco de 1938. E não temos, parece-me, cessado de regressar a 1938. E é tão confortável ser Kant quando temos Hobbes a guardar-nos a porta de casa. E, no entanto, tão hipócrita. Porque há alturas em que só podemos permanecer kantianos com a ajuda de Hobbes. Eu pelo menos, não gosto de ser ingrato em relação àqueles bravos rapazes que, arriscando a sua vida lá longe, me guardam o sono todas as noites.
Miguel Granja 

domingo, 21 de novembro de 2010

O que nos garante que o mundo não é apenas uma ilusão?

Eis uma ideia para os professores de filosofia da mesma escola aplicarem as suas faculdades críticas e funcionarem como uma comunidade de pares intelectualmente activos e verdadeiramente interessados na discussão dos problemas filosóficos. 

A ideia é a seguinte: cada professor escreve uma questão filosófica e um dos seus colegas responde numa folha a essa questão. Pretende-se, assim, que cada um enfrente o problema colocado por um dos seus colegas, sendo cada resposta o ponto de partida para uma boa discussão filosófica. Tudo isto pode e deve ser feito sem rede, isto é, sem ser necessário consultar bibliografia nem pedir ideias emprestadas a outros. Afinal, o professor de Filosofia deve estar sempre apto a pensar nessas coisas, mostrando o que é  pensar por si e apresentando simplesmente o resultado da sua reflexão. 

Essa foi, precisamente, uma das actividades realizadas pelo grupo de filosofia da ESMTG no dia internacional da filosofia. Eis a minha resposta à questão a que me coube responder.

E se o mundo não passasse de uma ilusão? E se nada existisse? O que é que nos garante que o mundo não é apenas uma ilusão? 
Eis uma resposta decepcionante, e talvez inesperada, às duas primeiras perguntas: se o mundo não passasse de uma ilusão, não passaria de uma ilusão; e se o mundo não existisse, não existiria. 
Bom, procurando ser um pouco mais construtivo, diria, por um lado, que se o mundo não passasse de uma ilusão, ficaríamos ainda com o problema aparentemente intratável de explicar a existência de tal ilusão e de compreender como poderia essa mesma ilusão ser algo que não faz parte do mundo. Por outro lado, se o mundo não existisse, não haveria quem perguntasse «E se o mundo não existisse?» Assim, para que estas mesmas perguntas façam sentido é preciso que o mundo exista. Ou, pelo menos, temos de pressupor tal coisa. 
Note-se que disse «pressupor» e não mais do que isso. O que me leva à terceira e, quanto a mim, mais interessante pergunta: o que nos garante que o mundo não é apenas uma ilusão? A minha resposta é que nada nos garante tal coisa. Isto se o mundo a que nos estamos aqui a referir for um mundo exterior e não o meu mundo interior ou mental. A este tenho acesso directo e não preciso de qualquer garantia extra. 
Até aqui creio estar muito bem acompanhado por um senhor escocês falecido há muito, chamado David Hume – se é que este senhor não passa de uma ilusão. Só que o senhor Hume acha que a falta de garantias nos conduz a uma espécie de comichão intelectual que não nos deixa fazer outra coisa senão coçar a cabeça. Mas para grandes males, grandes remédios, pelo que arrumou o assunto decidindo simplesmente fingir que não havia comichão. E é aqui que abandono a companhia do senhor Hume. 
O problema deste escocês foi ser demasiado exigente, pois achava que ter boas razões para acreditar que o mundo exterior existe equivalia a ter garantias disso. Mas ter boas razões para acreditar que P e ter a garantia de que P são coisas diferentes. 
Que garantias temos de que os fósseis com formas de peixe encontrados em locais distantes do mar não foram causados por peixes caídos do céu? A resposta é: nenhuma. E que garantia temos de que os locais onde foram encontrados os fósseis estivessem em tempos muito remotos debaixo do mar? A resposta continua a ser: nenhuma. Também aqui não temos qualquer garantia, mas não deixa de haver boas razões para acreditar nisso. Porquê? Ora, porque comparamos as explicações disponíveis para a existência dos fósseis com forma de peixe e esta é, de longe, mais satisfatória do que qualquer outra. 
Nunca podemos ter a garantia seja do que for, mas seria algo irracional ter melhores razões para acreditar que os fósseis vieram do mar do que o inverso e, apesar disso, não acreditar que vieram do mar por falta de garantias. Assim, temos também boas razões para acreditar que o mundo exterior existe. Podemos estar enganados? Claro que sim, mas temos boas razões para pensar que não.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

O bom professor de Filosofia

Ontem foi dia mundial da filosofia e, como é habitual em algumas escolas, também o grupo de professores de Filosofia da Teixeira Gomes decidiu assinalar o dia com algumas iniciativas. Desta vez, o grupo decidiu aproveitar para celebrar a filosofia homenageando um bom professor de Filosofia que tivemos a sorte de ter como colega de grupo e amigo, e que recentemente deixou de estar entre nós: Rui Cunha. Eis o meu texto de homenagem ao Rui e, através dele, também à filosofia.


Não é fácil definir um bom professor de Filosofia, como não é fácil definir um bom professor, seja de que disciplina for. Há, contudo, algumas características que nenhum bom professor de Filosofia pode deixar de exemplificar. Destaco três que me parecem fundamentais.
Em primeiro lugar, um bom professor de Filosofia tem de ter um genuíno interesse por aquilo que ensina. Quem não acredita realmente no valor do que ensina também não conseguirá fazer os estudantes acreditar nisso, pelo que dificilmente se sentirão motivados para aprender. O entusiasmo dos estudantes por determinadas matérias é, em boa parte, reflexo do entusiasmo dos seus professores. 
Em segundo lugar, nenhum professor passa da mediania se não tiver uma compreensão profunda do que ensina. Mesmo para explicar o mais simples é frequentemente preciso ter um domínio do mais complexo, seja para esclarecer uma dúvida mais subtil, para responder a uma dificuldade inesperada ou para satisfazer a legítima curiosidade do aluno mais exigente. Por vezes, o mais simples e óbvio é também o mais difícil de explicar: precisamente por parecer óbvio se ignoram as suas razões. Ora, o domínio do que se ensina exige, além do interesse referido atrás, estudo, informação e actualização constantes. O professor que considera já saber tudo desde que terminou o seu curso ou que acha suficiente o que se encontra no manual dificilmente poderá ser mais do que um mero funcionário do ensino. É, de resto, o domínio científico do que se ensina que, em boa parte, confere ao bom professor a serenidade e descontracção necessárias a um clima de aprendizagem sem grandes sobressaltos e a uma relação pedagogicamente saudável com os seus alunos.
Em terceiro lugar, nenhum professor de Filosofia (e não só) é realmente um bom professor se, mesmo dominando cientificamente as matérias que ensina, não for uma pessoa informada sobre o que de mais importante se passa nas artes, nas ciências e na história em geral. Até porque talvez nem sequer seja possível ser cientificamente competente em Filosofia ignorando o que de mais relevante se passa em outras áreas do saber, pois é frequentemente nessas áreas que se encontra a matéria-prima da reflexão filosófica e fonte importante de perplexidade filosófica. 
Mas será que há muitos professores de Filosofia assim? Não fiz qualquer investigação empírica sobre o assunto, pelo que não sei qual é a resposta. Mas sei que conheci um assim e que tive o prazer de o ter como colega na Escola Secundária Manuel Teixeira Gomes. Não precisei de assistir às suas aulas para apreciar o seu contagiante entusiasmo pela filosofia, o seu invulgar conhecimento científico e a sua enorme bagagem cultural. Esse professor foi Rui Daniel Cunha.
E nem sequer referi outras qualidades importantíssimas que o Rui também tinha: qualidades humanas como a simpatia, a boa disposição e a atenção aos outros. 
Muitas saudades, Rui.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Humor filosófico: será tudo relativo?

Eis duas piadas filosóficas tiradas deste livro e que têm em comum o ilustrarem a mesma ideia. Que ideia é essa?

A primeira piada:

Um homem está a rezar a Deus.
- Senhor, gostaria de te fazer uma pergunta.
O Senhor responde:
- Não há problema. Podes perguntar.
- Senhor, é verdade que, para ti, um milhão de anos é apenas um segundo?
- Sim, é verdade.
- Bem, nesse caso o que é um milhão de dólares para ti?
- Para mim, um milhão de dólares é apenas um cêntimo.
-Ah, nesse caso, Senhor - diz o homem -, podes dar-me um cêntimo?
- Claro - responde o Senhor -, só um segundo.

A segunda:

Um francês entra num bar. Traz um papagaio com um smoking empoleirado no ombro.
- Uau, que giro. Onde é que arranjou isso? - pergunta o empregado do bar.
- Em França - responde o papagaio. - Há milhões de tipos como ele lá.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Cogência

Quem sabe se o seguinte argumento é cogente e porquê?

Alguns portugueses são católicos.
Logo, alguns católicos são portugueses.

Podem deixar as vossas respostas na caixa de comentários.

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

A Filosofia, nas palavras de Rui Cunha

O grupo de professores de Filosofia da ESMTG no ano lectivo de 2006-2007. 
Rui Cunha é o primeiro da esquerda

Foi com tristeza que soube da morte de um excelente colega e amigo, que também foi professor de Filosofia nesta escola no ano lectivo de 2006-2007. Em memória de Rui Cunha, deixo aqui as palavras com que inicia o seu livro Existência, Sentido e Inferência (Arquimedes Livros, 2007).

Toda a filosofia consiste em propor teses, sejam elas epistemológicas, ontológicas, semânticas, estética, éticas, etc., e aduzir argumentos a favor, respectivamente contra, essas teses propostas. Qualquer tese deve ser formulada clara e concisamente, dado que crucial na sua eventual refutação é a produção de contra-exemplos [...]
Essas teses têm origem em problemas filosóficos, para os quais pretendem constituir soluções. Torna-se fundamental poder testar a validade dos argumentos apresentados em defesa dessas teses, para o que se torna imprescindível a existência de um método de análise desses argumentos. A lógica elementar, ao apresentar um cânone de regras de inferência válidas [...] fornece justamente uma base para esse método. 

Obrigado, Rui.

domingo, 17 de outubro de 2010

Duas ideias erradas acerca dos argumentos

Uma confusão muito frequente acerca dos argumentos é pensar que eles existem algures por aí e que nós nos limitamos a descobri-los. Mas isso é falso. Os argumentos não são como os cogumelos, que surgem por aí e que apenas temos de apanhá-los. Somos nós que criamos os argumentos quando procuramos defender, com razões, uma dada ideia ou opinião. E somos também nós que decidimos, quando discutimos ideias com os outros, se queremos ou não argumentar e, portanto, se as nossas afirmações constituem um argumento ou não. Mas, uma vez tomada a decisão de argumentar, isso é publicamente observável.

Algumas pessoas pensam, também erradamente, que a finalidade da argumentação em filosofia é ver quem ganha a discussão ou quem é mais inteligente. Mas a filosofia não está ao serviço de tais futilidades; os filósofos argumentam porque estão interessados na verdade.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Omnipotência

Há perguntas que nos deixam muitas vezes sem saber o que pensar. No teste diagnóstico que se encontra no início do manual A Arte de Pensar, do 10º ano, é feita uma pergunta para a qual alguns alunos nem sequer sabem como começar a responder, embora achem que há ali qualquer coisa que não bate certo. A finalidade da pergunta é precisamente a de deixar os alunos perplexos. Diz o seguinte: Poderá um ser omnipotente, como Deus, criar uma pedra tão pesada que ninguém a possa levantar?

Bom, quando se fala de «ninguém», isso inclui o próprio ser omnipotente. A pergunta parece conduzir-nos à ideia de que há algo de errado com a própria ideia de omnipotência e, por consequência, algo de errado também com a ideia de um deus omnipotente. Será?

Vamos tentar reformular a pergunta, para ver se compreendemos melhor o que está em causa. Proponho que se reformule da seguinte maneira: Será que um ser omnipotente pode criar algo que não possa criar?

Pois, se esta for uma reformulação correcta da nossa pergunta inicial, parece ficar mais claro que o problema talvez não seja a resposta, mas o que se pede na própria pergunta. Seria mais ou menos como perguntar se um ser que sabe tudo também sabe coisas que não sabe; ou que consegue criar coisas redondas que são quadradas.

No livro Que Diria Sócrates, organizado pelo filósofo Alexander George, alguns filósofos respondem a perguntas filosóficas de pessoas comuns. Deixo aqui um excerto do livro com a mesma pergunta, respondida pelo filósofo Richard Heck.

Pode Deus fazer uma pedra tão pesada que Ele próprio seja incapaz de a levantar? Se pode, então não é todo-poderoso. Mas se não a puder fazer, então também não será todo-poderoso. Em qualquer destes casos, temos uma coisa que Deus não consegue fazer. Assim, parece seguir-se que Deus (ou qualquer outra coisa, para o efeito) não pode ser omnipotente. 
RICHARD HECK: Apresenta-nos uma versão de um problema antigo, um problema que é incessantemente discutido por teólogos. Na sua formulação mais simples, diz o seguinte: Pode Deus fazer uma pedra que seja simultaneamente grande e não grande? É óbvio que não. Logo, Deus não é omnipotente.
A resposta mais conhecida a esta questão, favorecida por Tomás de Aquino, é que temos de ter mais atenção quanto ao modo como entendemos o conceito de omnipotência. Ser omnipotente não é ser capaz de fazer seja o que for: é ser capaz de fazer tudo o que é possível ser feito. Poderia Deus fazer uma pedra que fosse simultaneamente grande e não grande? Não. Mas o facto de Deus ser incapaz de o fazer não ameaça a omnipotência de Deus, uma vez que jamais seria possível existir uma pedra que fosse ao mesmo tempo grande e não grande. De igual modo, se Deus é omnipotente, então é simplesmente impossível existir uma pedra tão grande que Ele não possa levantá-la. Assim, o facto de Deus não poder criar uma pedra tão grande que Ele não possa levantá-la não constitui um limite ao poder de Deus.
Vale a pena referir também que alguns filósofos – René Descartes, por exemplo – defenderam que Deus poderia fazer uma pedra que fosse simultaneamente grande e não grande! Segundo esta perspectiva, os poderes de Deus são completamente ilimitados, a ponto de Deus não estar sequer limitado pelas leis da lógica. Pode ser impossível, para nós, compreender como se consegue tal feito, mas esta incompreensão deve-se ao facto de as nossas mentes serem finitas, sendo a do Criador infinita.

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Saber fazer perguntas

Esta enorme pintura mural do artista renascentista italiano Rafael, intitulada A Escola de Atenas, representa os maiores filósofos da antiguidade em animada discussão. O encontro de filósofos descrito na história de Ned Markosian seria algo parecido a isto.

Um dos aspectos mais importantes da actividade filosófica é fazer as perguntas certas. Ao contrário do que muitos possam pensar, saber fazer perguntas é frequentemente tão ou mais difícil do que dar boas respostas.  Até porque as respostas dependem das perguntas e perguntas desinteressantes ou mal formuladas costumam ter como resultado respostas também elas desinteressantes e insatisfatórias. Num certo sentido, o bom filósofo é como o bom detective; é aquele que procura fazer as perguntas certas para atingir o seu objectivo, que é chegar à verdade. 

Esta pequena e interessante história inventada pelo filósofo americano Ned Markosian mostra bem como fazer boas perguntas não é uma tarefa fácil. 

sábado, 17 de julho de 2010

O que eu penso sobre o valor da arte...


... está neste meu livro acabado de publicar pela editora do Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa. Trata-se de um livro um pouco avançado para ser lido por alunos do secundário. Tem, contudo, algumas secções bastante acessíveis, que podem ser lidas por qualquer pessoa com genuínos interesses filosóficos, mesmo sem formação especializada na área. Críticas são sempre bem vindas.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

Ética da clonagem

                                   Imagem do filme Gattaca, de Andrew Niccol

A discussão filosófica exige algum cuidado e subtileza, não dispensando frequentemente o recurso a informação empírica fidedigna e relevante. Verifico que a tendência para esquecer isso é particularmente notória em casos como a discussão sobre a moralidade da clonagem humana reprodutiva. Neste caso, a argumentação cuidada é tantas vezes substituída por cenários fantasiosos, que mais parecem inspirados nos filmes de Hollywood. Eis algumas dessas fantasias e ideias apressadas, que não têm qualquer sustentação na mais rigorosa informação disponível:

1. Se a clonagem humana reprodutiva for permitida, as pessoas passarão a ser quase todas iguais.

Mas por que razão iriam ser quase todas iguais? A não ser que só fosse permitido fazer clones de umas quantas matrizes seleccionadas, isso não faz qualquer sentido. Clones de pessoas diferentes são também diferentes.

2. Os clones não têm identidade própria.

Pensar que os clones não têm identidade própria é pensar que a personalidade de uma pessoa e aquilo que ela realmente é depende exclusivamente dos seus genes. Mas sabe-se que isto é pura e simplesmente falso. Há também quem diga que pessoas que partilham o mesmo ADN têm maior propensão para sofrer crises de identidade. Mas em que estudos sérios se baseia tal afirmação?

3. A clonagem põe em causa os processos naturais de reprodução.

Falso. A prática da clonagem não implica o fim da reprodução natural. Basta pensar que as pessoas que se opõem à clonagem com este mesmo argumento nunca iriam deixar de ter filhos recorrendo a processos de reprodução natural. As pessoas são diferentes e, por isso mesmo, querem coisas diferentes.

4. A clonagem não é um processo de reprodução natural.

Sim, e depois? Qual é exactamente o problema? Grande parte da medicina também não é natural e não tomamos isso como um mal. Bem pelo contrário. Usar lentes de contacto, pintar o cabelo e andar de avião também não são coisas naturais, mas ninguém acha isso moralmente inaceitável.

5. Os clones seriam o resultado de desejos egoístas dos seus progenitores.

Mas porquê? De resto, quantas vezes os pais não educam os seus filhos naturais em função dos seus desejos e não tanto dos próprios filhos?

E já nem sequer vale a pena falar na completa fantasia dos clones todos de olhos azuis e fartos cabelos louros, como se todas as pessoas gostassem do mesmo.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Ciência e indução

Karl Popper é, na linha de David Hume, um dos mais destacados críticos da indução, desvalorizando o papel deste tipo de raciocínio na construção do conhecimento científico. Mas será que Popper tem razão e a  indução é desnecessária para a ciência? Seria possível fazer previsões científicas tão rigorosas e nas quais confiamos plenamente sem confiar na indução? Afinal, o que levará um médico a receitar antibióticos quando apanhamos uma forte gripe?

terça-feira, 11 de maio de 2010

Será a clonagem humana uma prática eticamente aceitável?


Este é o titulo de um ensaio filosófico de David Nunes, aluno do 11º C de 2008. Não tive oportunidade de lhe pedir autorização para publicar aqui o seu ensaio, mas não levantou qualquer problema quando, na altura da sua discussão, referi tal possibilidade. Eis, pois, a resposta do David:

Em primeiro lugar, é preciso compreender o que é a clonagem. A clonagem é um processo que alguns seres vivos utilizam para a sua reprodução, a reprodução assexuada. É um processo em que o material genético dos descendentes é exactamente igual ao do progenitor. Daí que a reprodução assexuada seja considerada um processo de clonagem. No caso dos seres humanos, a reprodução natural é realizada por um processo designado de reprodução sexuada, em que há a combinação do material genético de ambos os progenitores, e por isso não é um processo de clonagem.
Existem dois tipos de clonagem humana, a clonagem terapêutica, e a clonagem para fins reprodutivos. Na clonagem para fins terapêuticos são utilizados excertos de células que, por mitose, multiplicam o número de células iniciais, podendo assim ser utilizados para salvar a vida do paciente. A clonagem reprodutiva é um processo em que é utilizado o núcleo de uma célula, e este é transferido para um zigoto, em que por uma descarga eléctrica é unido o núcleo ao ovo e, se for bem-sucedido, este começará a dividir-se, levando à formação de um ser humano que é um clone do indivíduo dador da célula de onde proveio o material genético contido no núcleo. A clonagem terapêutica é pouco contestada, pois a sua utilização apenas visa melhorar a qualidade de vida de certos indivíduos que, por alguma razão médica, necessitam de recorrer a este método.
Apesar de a clonagem com fins reprodutivos ser muito contestada, defendo que não há nada de moralmente errado nisso. Assim, penso que não preciso de argumentar a favor da clonagem, bastando-me mostrar que os argumentos contra essa prática não são bons.
Um dos mais comuns argumentos dos opositores da clonagem humana é o chamado «argumento da identidade», de acordo com o qual é errado clonar seres humanos porque este processo, ao reproduzir num indivíduo (o clone) o mesmo material genético de outro indivíduo (a matriz), está a privar aquele indivíduo (o clone) de uma identidade própria.
Outro argumento contra a clonagem humana é que há o perigo da instrumentalização porque os clones poderão ser criados como meios para atingir os nossos fins: se a clonagem se vulgarizar, os clones serão utilizados para ultrapassar frustrações e fracassos que algumas pessoas tiveram durante a vida. Visto que os clones são indivíduos geneticamente iguais, algumas pessoas poderiam pensar que a clonagem seria como uma segunda oportunidade na vida. Isto acontecerá com alguns pais, que já nos dias de hoje querem que os seus filhos sejam o que eles não conseguiram ser. Com os filhos a serem clones dos pais, este efeito iria acentuar-se, pelo que os clones também poderiam ser utilizados para substituir pessoas que morreram, tomando o clone o lugar dessa pessoa.
Há o argumento do perigo da eugenia, a qual consiste no aperfeiçoamento ou eliminação de características físicas e mentais dos indivíduos. Existem dois tipos de eugenia, a eugenia negativa em que é feita uma selecção de características negativas, como malformações do feto ou doenças hereditárias, e há a eugenia positiva, em que são seleccionadas características que sejam desejadas para o indivíduo, tais como a cor dos olhos, a cor do cabelo, etc. Isto significa que se pode pré-determinar características que se pretende que a pessoa venha a ter, correndo-se o risco de dar origem apenas a indivíduos com certas características.
Há ainda o argumento do apelo à natureza, cujos defensores alegam não ser a clonagem humana um processo natural. Dado que a clonagem não requer a junção de um espermatozóide e de um óvulo, ela vai contra o funcionamento da natureza, sendo, por isso, moralmente errado recorrer a ela.
Creio, contudo, que todos estes argumentos falham. Em resposta ao argumento da identidade, basta notar que identidade de uma pessoa não depende apenas dos seus genes; depende também das suas experiências, do meio em que o indivíduo vive e da sua educação, entre outros aspectos. O ADN dos gémeos monozigóticos é exactamente o mesmo, mas isso não implica que ambos pensem ou reajam da mesma maneira aos mesmos estímulos, mesmo tendo vivências semelhantes.
Em resposta ao segundo argumento – os clones poderiam ser utilizados como instrumentos ao serviço de certos fins –, é preciso sublinhar que isso só iria acontecer se admitíssemos que a personalidade do clone, a sua vontade, etc., estariam completamente determinados pelos seus genes, o que já se viu ser falso. Por exemplo, o clone criado para substituir uma pessoa que faleceu não seria exactamente a pessoa que faleceu: os seus estados psicológicos não seriam os mesmos, pois este não teve as mesmas vivências que o falecido teve e, portanto, seria outra pessoa diferente.
Em resposta ao argumento da eugenia, se escolhermos através da manipulação genética algumas características que se quer que o indivíduo venha a ter para ser quase perfeito, então este não conteria genes apenas de um só dador. Mas para que um indivíduo seja um clone tem que ter os seus genes iguais ao de uma só matriz. Ora, no caso da eugenia o indivíduo teria um conjunto de genes de vários dadores, ou seja, um conjunto genético que mais ninguém possui. Logo, como não tem o mesmo conjunto genético de um dador, não é um clone.
Em conclusão, não havendo bons argumentos contra a clonagem reprodutiva humana, também não faz sentido afirmar que ela é moralmente inaceitável.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

Poderão as máquinas pensar?

Um pequeno pedaço do cérebro do leitor ficou danificado, o que o fez ficar cego. Mas, felizmente, há uma nova técnica biomédica que pode devolver-lhe a visão. Os cientistas desenvolveram um chip de sílica minúsculo, demasiado pequeno para ser visto a olho nu, que duplica exactamente as funções da parte danificada do seu cérebro. Eles podem retirar essa parte e substituí-la pelo chip. Depois da operação, é capaz de ver novamente. De resto, não nota qualquer diferença. Ficou como novo.
Pouco depois, no entanto, outro pedaço do seu cérebro fica danificado. Desta vez perdeu a capacidade de se recordar de nomes. Porém, uma vez mais, os cientistas são capazes de substituir esse pedaço por outro chip minúsculo que desempenha a mesma função e, quando a cirurgia acaba, não consegue notar qualquer diferença, excepto que é capaz de se recordar de nomes novamente.
Imagine agora que isto acontece repetidamente até todo o seu cérebro ser substituído. Em cada passo do processo, com a excepção do problema que foi corrigido, não consegue detectar qualquer diferença em relação ao que acontecia antes. Quando o processo fica concluído, no entanto, já não tem um cérebro orgânico. Tem antes um cérebro artificial, uma rede de chips de sílica que funciona exactamente como o modelo orgânico original.
Este argumento mostra não só que uma máquina pode pensar, mas também que nós poderíamos ser essa máquina. Se duvida disto, recue ao primeiro passo por um momento. Suponha que ficava realmente cego e que os cientistas se dispunham a devolver-lhe a visão, implantando um dispositivo capaz de desempenhar a função da parte defeituosa do seu cérebro. Recusaria a proposta, alegando que nenhum dispositivo artificial pode produzir efectivamente a visão humana? Iria preferir permanecer cego? A maior parte de nós aproveitaria a oportunidade de recuperar a visão dessa forma. Contudo, a partir do momento em que o processo de substituição gradual se iniciou, não há qualquer ponto no qual possamos traçar a linha e dizer que agora a consciência humana se extinguiu. Além disso, não podemos dizer que a consciência se está a extinguir um pouco de cada vez. Afinal, ainda consegue ver, recordar-se de nomes e assim por diante. Se o seu cérebro novo pode fazer tudo o que o original fazia, e não há qualquer ponto em que se sinta «diferente», temos de concluir que o cérebro artificial está a sustentar a mesma vida mental que o original.
O argumento tem um passo adicional. Suponha que nada acontece de errado com o seu cérebro e que não é sujeito a quaisquer operações. Em vez disso, os cientistas montam as mesmas partes no laboratório e colocam-nas num robot. O robot seria consciente, uma coisa pensante? Se admitirmos que essa colecção de partes poderia sustentar uma vida mental dentro do seu crânio, não há qualquer razão para que não faça o mesmo dentro da cabeça do robot. Logo, o robot seria um ser pensante no mesmo sentido em que nós somos seres pensantes.
James Rachels, Problemas da Filosofia (Gradiva, 2009) 

domingo, 25 de abril de 2010

Liberdade e justiça


Comemoram-se hoje em Portugal 36 anos da revolução de 25 de Abril. Independentemente das razões que levaram os militares a rebelar-se contra o poder político instituído, os portugueses aderiram imediatamente à revolução, esperando que ela lhes trouxesse uma sociedade melhor.

Não pretendo discutir se isso foi conseguido ou não, pois é facilmente argumentável que uma sociedade democrática, como a que se seguiu à revolução, é sempre melhor do que qualquer ditadura. Todavia, muitas pessoas que naturalmente se entusiasmaram com a revolução de Abril parecem agora concluir melancolicamente: tanta coisa para tão pouco! Como se explica isso?

A verdade é que não queremos apenas viver numa sociedade melhor; desejamos, além disso, viver numa sociedade justa. Ora, muitas pessoas viam o 25 de Abril como uma promessa de uma sociedade justa. Mas acontece que nenhuma revolução permite garantir a existência de uma sociedade justa. O melhor que uma revolução pode fazer é estabelecer as condições necessárias, mas não suficientes, para uma sociedade justa.

Foi isso que aconteceu com a revolução do 25 de Abril: criou em Portugal algumas das condições necessárias para uma sociedade justa, a mais importante das quais é a liberdade, permitindo que todos os cidadãos beneficiem das mesmas liberdades básicas. Sem isto não pode haver uma sociedade justa. Mas isto não é suficiente para haver justiça social. O que falta não depende de qualquer revolução, pelo que foi algo ingénuo esperar que o 25 de Abril nos garantisse automaticamente justiça social.

A palavra que melhor descreve a revolução do 25 de Abril de 1974 em Portugal é, pois, «Liberdade». O que não é pouco.

sábado, 17 de abril de 2010

Filosofia e história das ciências da natureza

Escrevi este texto para os alunos do 11º ano lerem antes mesmo de começarmos a discutir alguns dos problemas de filosofia da ciência.

Para os orientar na leitura do texto, deixo seguidamente um conjunto de perguntas às quais devem tentar responder. Espera-se por respostas curtas e directas.


1.     Tanto os mitos como a ciência respondem, por vezes, às mesmas perguntas. O que diferencia as respostas científicas das míticas ou religiosas?
2.     Há um aspecto ao qual pela primeira vez Tales de Mileto dá importância e sem o qual a ciência não se teria desenvolvido. Qual é?
3.     Porque é que para alguns filósofos gregos, como Platão, o mundo natural não poderia ser objecto de conhecimento?
4.     Porque é que se diz que Aristóteles deu um passo importante na direcção da ciência tal como a conhecemos?
5.     Em que consistia a ciência para os filósofos cristãos medievais?
6.     Copérnico apresentou uma teoria completamente revolucionária. Quem nome tem e em que consiste?
7.     Qual foi o grande contributo que Bacon deu para a origem da ciência moderna?
8.     Para Bacon a ciência deveria ser activa e operativa. O que quer isso dizer?
9.     Há 3 tipos de razões que fazem de Galileu o pai da ciência moderna. Quais são?
10.  Uma das consequências da ciência moderna é a concepção mecanicista da natureza. O que é o mecanicismo?
11.  O mecanicismo é uma forma de reducionismo. O que é o reducionismo?
12.  A física newtoniana parece não deixar dúvidas sobre o que é e como se faz ciência. Mas Hume chama a atenção para outro problema. Que problema é esse?
13.  O raciocínio de tipo indutivo está na origem de muitas das verdades científicas. Segundo Hume isso é fatal para a própria ciência. Porquê?
14.  O que é o positivismo?
15.  O que é o cientismo?
16.  O que é o fisicalismo?
17.  De todos os nomes que o texto refere, quais pareceram ser os 3 mais importantes para a história e desenvolvimento da ciência?
18.  E para a filosofia da ciência?
19.  Poderá o tipo de explicação fornecido pelas ciências sociais ser idêntico ao das ciências da natureza
20.  O que foi mais difícil de compreender no texto?

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Sobre o problema ético da eutanásia

Eis algumas ligações a textos disponíveis na net sobre o problema ético da eutanásia:

Eutanásia, de Helga Kuhse
O problema ético da eutanásia, de Faustino Vaz
Eutanásia: Emergindo da sombra de Hitler, de Peter Singer
Eutanásia, de Philippa Foot
Será a eutanásia moralmente aceitável? de Ekaterina Kucheruk
O erro da eutanásia, de J. Gay-Williams

Esta lista de textos poderá ainda ser actualizada. Estejam atentos.

domingo, 28 de março de 2010

O que é a ética?

Eis o início, bem humorado, de uma boa resposta:

Separar o que é bom do que é mau é aquilo de que se ocupa a ética. É igualmente o que mantém padres, especialistas e pais ocupados. Infelizmente, o que mantém as crianças e os filósofos ocupados é perguntar aos padres, especialistas e pais: Porquê?

De Thomas Cathcart e Daniel Klein, Platão e um Ornitorrinco Entram num Bar (Dom Quixote)

terça-feira, 23 de março de 2010

Falácias do optimista e do pessimista

Eis uma maneira de raciocinar falaciosa, típica do optimista:

Se P, então Q.
Mas Q seria uma chatice.
Logo, não P.

Eis uma maneira de raciocinar falaciosa, típica do pessimista:


Se P, então Q.
Mas Q seria muito bom.
Logo, não P.


No fundo, tanto o optimista como o pessimista acabam por ser preguiçosos.

terça-feira, 16 de março de 2010

O que conta como justificação?

David Hume alega que não há qualquer justificação para a nossa crença na existência do mundo exterior (de algo além dos nossos conteúdos mentais). Diz ele que não há provas irrefutáveis da existência de objectos exteriores, pois apenas temos acesso às nossas próprias percepções, que são diferentes dos eventuais objectos percebidos. Ora, a crença de que os objectos exteriores são as causas das nossas percepções é uma espécie de tiro no escuro, pelo que tal crença, considera ele, não está justificada.

Mas será que Hume tem razão? Será que uma crença só está justificada se tal crença se apoiar em provas irrefutáveis?

terça-feira, 9 de março de 2010

Valores

Ouvimos frequentemente pessoas a lamentar-se de que vivemos numa sociedade sem valores, que a juventude actual não tem valores ou que há uma crise de valores. Mas será que podemos viver mesmo numa sociedade sem valores? O que significa isso? E de que estamos realmente a falar quando falamos de crise de valores? Será que «crise de valores» e «ausência de valores» significam a mesma coisa?

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Espirro, logo existo

«Penso, logo existo» disse Descartes. Mas por que não «Espirro, logo existo»? Não vai tudo dar ao mesmo?

sábado, 13 de fevereiro de 2010

Inteligência artificial para humanos e outras máquinas

É já no próximo dia 19 de Fevereiro que se realiza no auditório da ESMTG a XI Conferência de Filosofia da Teixeira Gomes. Desta vez o conferencista é Porfírio Silva, doutor em epistemologia e filosofia da ciência pela Universidade de Lisboa e investigador do Instituto de Sistemas e Robótica, do Instituto Superior Técnico. O título da conferência é São eles que não são inteligentes ou nós que somos mesmo máquinas?

É às 15 horas e estão todos convidados. Apareçam.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Moral e religião


«Se Deus não existisse, tudo seria permitido», disse Dostoievski. A ideia aqui presente é que a distinção moral entre o bem e o mal (entre o moralmente certo e o moralmente errado ou entre o que deve e o que não deve ser feito) não depende da perspectiva de cada pessoa nem do que é socialmente aprovado; apenas Deus determina o que é moralmente certo e o que é moralmente errado. Mas será que o fundamento da moral é a religião? E será que a ilustração acima nos consegue dar algumas pistas sobre a resposta à pergunta anterior?

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

A moral incomoda. Porquê fazer o que nos incomoda?


Dizem-nos tantas vezes que não se deve fazer o que nos está mesmo a apetecer fazer; que é errado fazer o que nos dava mesmo jeito fazer; que temos a obrigação de fazer o que não nos convém mesmo nada fazer. Mas porquê? 

Por que não havemos de fazer simplesmente o que nos apetece ou o que mais nos interessa, independentemente de isso ser correcto ou não? Não é verdade que a moral nos atrapalha tantas vezes e que parece ir contra os nossos interesses pessoais? Sendo assim, por que havemos de ser morais? Por que não proceder como Jean-Baptiste Grenouille, a personagem principal do filme (e do livro) O Perfume, e simplesmente esquecer a moral? Algum dos leitores tem alguma ideia?

terça-feira, 26 de janeiro de 2010

A natureza da ética

Desculpa, João, eu sei que agi mal, pois agi sem pensar. Deixei-me levar pelas minhas emoções e fiz asneira.

O que nos mostra isto acerca da teoria do emotivismo moral?

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

Objectivismo moral


Ana - Matar animais para os comer é moralmente errado. Não concordas Rui?
Rui - Não. Pelo contrário, matar animais para os comer nada tem de errado. E tu, Carla, concordas comigo ou concordas antes com a Ana?
Carla - Humm, para ser sincera, não sei bem. Estou algo confusa e não sei o que pensar sobre isso.

Tendo em conta que o objectivismo moral defende que o certo e o errado não dependem das opiniões de cada pessoa, será que tanto a Ana como o Rui e a Carla podem ser todos objectivistas?

Podemos realmente saber/conhecer alguma coisa?


Quão grande é realmente a diferença entre saber algo ou pensar que se sabe algo?

Pegando no exemplo discutido na última aula:

Um homem apaixonado por ténis e muito rico viaja para ver um jogo fenomenal entre duas estrelas, que já tinham jogado entre si no ano anterior. Chega ao campo em cima da hora, não arranja bilhetes e como o jogo já começou vai para o hotel vê-lo na televisão. Depois, no pub, um amigo diz-lhe que o jogo foi adiado por umas horas por causa da chuva e que em vez de passarem o jogo desse ano passaram o do ano passado e que, por acaso, o resultado final foi igual.

Portanto, ele tinha a crença de que o seu jogador favorito tinha ganho, a crença era justificada porque o tinha visto na tv e por acaso era verdadeira... Mas será que isso faz com que ele soubesse que o seu jogador preferido tinha ganho? Na minha opinião não, porque a sua justificação não era aceitável, apesar de pensar que o era. Ele não sabia... Ele pensava que sabia.

É como as cores, por exemplo... quando olhamos para uma parede branca pensamos o óbvio: ela é branca. Porém analisemos: as cores que nós vemos são as que são reflectidas para os nossos olhos, mas, se são reflectidas, então o objecto em questão não as tem...assim sendo, as verdadeiras cores de um objecto são as que ele tem, ou seja, as que ele absorve. se vemos a parede branca é porque ela reflecte o branco, ou seja, reflecte todas as cores. Se reflecte todas as cores, não possui nenhuma, logo, a parede é preta.

Nós tinhamos a crença de que a parede era branca, e a crença era justificada: nós viamos com os nossos proprios olhos! Mas será que a justificação é boa? Ou so parece que é boa? E se não for, como podemos saber quando uma justificação é ou não é realmente boa? Como podemos realmente saber alguma coisa?

quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Conhecimento? O que quer isso dizer?

Professor - Será que todo o conhecimento é adquirido ou, pelo contrário, há coisas que nós sabemos e que não foi preciso aprender?
Ana - Acho, professor, que há certas coisas que nunca precisámos de aprender e que, portanto, vêm connosco de nascença.
Professor - Quer isso dizer que há conhecimentos inatos?
Ana - Sim, é isso mesmo.
Professor - És capaz de dar um exemplo de um conhecimento assim?
Ana - Olhe, professor, eu nunca aprendi a respirar: é algo que eu sei desde sempre.

Será a resposta da Ana uma boa resposta?